sexta-feira, 20 de junho de 2008

DESPEDIDAS


(...)Doeu saber que, em breve, eu não teria mais aquele peito bonito ao alcance dos olhos. E da mão. E da boca. Pexei lavínia e prendi seu corpo num abraço(...)Chuva, um motivo a mais para ficarmos confinados no quarto, embora não precisássemos de motivos. Lavínia e eu passamos horas na cama, suando. Um inventando maneiras de agradar o outro.
Poucas vezes me senti tão confortável no mundo. E, no entanto, sofria, por antecipação, o grande vazio que seria o resto da minha existência sem ela.
(...)Talvez por saber que era o fim, e a gente nunca se comporta mesmo muito bem nos finais, ou talvez por impotência, desamparo, angústia; e também por covardia, não há vergonha alguma em admitir; talvez por tudo isso, e à falta de um nome adequado para a sensação de impotência que me esmaga, o fato é que desabei(...)
(...)Vivíamos o fim da nossa história, mas só eu sabia disso. E não deixei tranparecer (...)O marido voltaria de viagem naquele dia(...)Lavínia também dissia que eu estava fugindo. Abandonando-a.
Fiquei vários dias sem vê-la (...)Decidi não procurá-la ( no íntimo, não tenho por que esconder, esperava que ela ligasse). E, ainda que de maneira lenta e errática, comecei a empacotar minha mudança. Sem pressa (...)Uma retomada depois de um período de aventura irresponsável. Um recomeço, mais um dos que tive na vida(...)
(...)Ela me telefonou , disse que queria me ver. Marcamos para um final de tarde(...)Providenciei música de ocasião - a Missa solemnis, op. 123, com a orquestra de Cãmara da Europa, regida por Harnoncourt; de cortar o coração, até mesmo um coração inconstante como o de Lavínia. E deixei a solenidade por conta apenas da trilha sonora servindo conhaque...Sentados no sofá, bebemos e conversamos sobre outras coisas bem mais amenas. Falamos do passado e evitamos, por um tempo, mencionar o futur. Evocamos com carinho o dia do nosso primeiro encontro, Lavínea lenbrou-se de terconsultado os astros naquele dia. Eles apregoavam: jogue-se na vida.
Perguntei por que me escolhera.
Gostei do jeito que você me olhou, disse. Parecia que estava pedindo desculpas por me achar tão bonita.
Remova a poesia do que ela falou: eu a olhei com uma fome que nunca senti por nenhuma outra mulher. Um episódio inaugural. E, também fui olhado de uma maneira que ainda não tinha acontecido antes. Conhecê-la fez do passado um mero ensaio, um treino antes de ser exposto à sua incandescência (...)Um soneto inacabado.(...)Eu ia embora.(...)A missa chegou ao fim, a música cessou, porém não me mexi. (Nunca mais ouviríamos Bethoven juntos, como que acompanha uma oração Fiquei quieto, deixei que aquela sala escutasse pela última vez os acordes da voz de Lavínia. Ela relatou um sonho: nós dois numa cidade deserta, sem mais ninguém. Uma cidade pintada inteirinha de azul, como no soneto do Penna Filho. Foi o mais próximo que chegamos a falar do futuro. Mas evitamos.Assim como evitamos incluir o marido na conversa.
Falamos, falamos, falamos. E mesmo assim faltou dizer tanta coisa. E escultar também. Ela nunca disse que me amava. Jamais ouvi de seus lindos lábios essa sentença.
Lavínia levantou-se na penumbra e disse:
Preciso ir agora.
Então era isso. The end. O que eu poderia fazer? Propor um brinde? Dizer: foi bom, valeu? Prometer que telefonaria, ao menos no aniversário dela? Que mandaria postais - da praça da Sé ou da Liberdade? Que voltaria qualquer dia para visitar a cidade como turista? Que a esqueceria?
Eu não podia prometer nada disso.
Nem pedir que ela me procurasse,caso fosse a São Paulo numa das viagens com o marido. Ou que me escrevesse de vez em quando para dar notícias de sua singularíssima pessoa.
Embora estivesse morrendo de vontade, não pedi que abrisse o vestido, para que minha sede pudesse despedir-se das fontes de seu corpo. Sabia que não me saciaria (...) Lavínea baixou a cabeça, chorava em silêncio(...)Então nos abraçamos. Enos beijamos. Achei em sua boca um gosto que misturava cigarro, conhaque e remédio. E tristeza. Nós dois tremíamos(...) Você está me abandonando, ela disse. Apertei seu corpo e beijei seu rosto, suas lágrimas, seu pescoço(...)
Me pede pra ficar, falei.
Não posso, ela disse.

(trechos do livro do Marçal Aquino "Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios).

Nota do leitor: o que sinto é que a decisão foi somente da Lavínia, pois tudo deveria voltar para seu lugar, para o lugar "certo": ela para o marido e ele para o mundo...Durante a relação deles, ouve comentários do tipo isso não dará certo, nunca deu certo para histórias parecidas. Mas mesmo assim eles sonharam e chegaram a acreditar na possibilidade impossível. Até que a realidade veio bater à porta e no final mais uma vez TODOS TINHAM RAZÃO...

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