Este é um trecho do livro "O vendedor de passados" de José Eduardo Agualusa.
"... Antigamente todos os contos para crinaças terminavam com a mesma frase, e foram felizes para sempre, isto depois de o Principe casar com a Princesa e de terem muitos filhos. Na vida, é claro, nenhum enredo remata assim. As Princesas casam com os trapezistas, a vida continua, e os dois são infelizes até que se separam. Anos mais tarde, como todos nós, morrem. Só somos felizes. verdadeiramente felizes, quando é para sempre, mas só as crianças habitam este tempo no qual todas as coisas duram para sempre. Eu fui feliz para sempre na minha infância, lá na Gabela, durante as férias grandes, enquanto tentava construir uma cabana nos troncos de uma acácia. Fui feliz para sempre nas margens de um riacho, uma corrente de água tão humilde que dispensava o luxo de um nome, embora orgulhoso o suficiente para que o achássemos mais do que um simples riacho - era o Rio... Nas aulas de catequese um velho padre de voz sumida e olhar cansado tentou, sem convicção, explicar-me em que consistia a Eternidade. Eu achava que era um outro nome para as férias grandes. O padre falava de anjos e eu via galinhas, Até hoje, aliás, as galinhas são o que conheço de mais aparentado com os anjos. Ele falava-nos da bem-aventurança e eu via galinhas ciscando ao sol, escavando ninhos na areia, revirando os pequenos olhos de vidro, num puro êxtase místico. Não consigo imaginar o Paraíso sem galinhas. Nem sequer o Bom Deus, estendido preguiçosamente numa fofa cama de nuvens, sem que que o rodeie uma mansa legião de galinhas. Aliás, nunca conheci uma galinha má - você conhceu? As galinhas, como as salalés, como as bosboletas, são imunes ao mal."
"A realidade é dolorosa e imperfeita. É essa a natureza e por isso a distinguimos dos sonhos. Quando algo nos parece muito belo pensamos que só pode ser um sonho e então beliscamo-nos para termos certeza d que não estamos a sonhar - se doer é poque não estmos a sonhar. A realidade fere, mesmo quando, por instantes, nos parece um sonho. Nos livros está tudo o que existe, muitas vezes em corem mais autênticas, e sem a dor verídica de tudo que realmente existe. Entre a vida e os livros, meu filho, escolhes os livros."
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Soy contra!
ResponderExcluirSó há a perfeição do que nos livros está porque um dia o que lá está foi vida... alguém se arrisca a dizer que já há nos livros tudo o que na vida pode se ter?